sábado, 7 de maio de 2011

"Raízes", texto inédito de Paula Fonseca; imagem:"google"



Em homenagem a meu pai, Arlindo Alves Fonseca e a meu avô paterno, José Alves da Fonseca.


Raízes


Um dia, ofereceram a um eremita a possibilidade de registar as suas memórias em dois lugares diferentes: nas areias da praia, registaria as más para que fossem levadas pela maré; nos rochedos, em volta, esculpiria as boas para que fizessem face ao tempo.
O eremita, de vestes acossadas e remendadas pela vida, declinou a oferta e explicou que as guardaria a todas: boas e más, no mesmo lugar - dentro de si. Acrescentou, pera espanto de todos os mui ilustres presentes, que plantaria, por cada má lembrança, uma orquídea e, por cada momento de felicidade, uma árvore de fruto. Teria, assim sendo, um jardim e um pomar dentro de si.
Procedendo da forma acima descrita, jamais ele se esqueceria que, relativamente às más recordações, devemos considerar a sua raiz pequena e, relativamente às boas, a sua raiz deve ser longa e forte. Recordaria que só as segundas devem dar fruto, seja ele – mais ou menos maduro; mais ou menos duradouro.
Terminou, lembrando que TODAS as suas memórias: boas e más tinham feito dele aquilo que ele era. Livrar-se, nem que fosse de uma só, era negar um pedaço de si mesmo!
Lágrimas se escapavam enquanto discursava, pérolas de aprendizagem que não recusava. Lágrimas de um instante, em sorrisos de eternidade...


Paula Fonseca